Herman Hoeksema
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto
A apresentação do conselho de paz ou pacto de redenção deve ser mudada quando a idéia de um pacto não é entendida como sendo um contrato ou um acordo, mas é concebida como sendo uma relação viva e espontânea e uma comunicação de amizade que é dada com a própria natureza e relação de Deus e o homem no pacto. O pacto não é uma relação incidental, mas pertence à própria essência da relação no pacto.
Em íntima conexão com essa apresentação da idéia do pacto, o conceito do pacto de redenção deve ser alterado de forma que esse pacto não seja considerado como um meio para um fim, como um caminho para a salvação, mas como o próprio fim, como o lugar mais alto a ser alcançado pela criatura; não como um caminho para a vida, mas como a forma mais alta da própria vida; não como uma condição, mas como a própria essência da religião; não como um meio para a salvação, mas como a maior bem-aventurança. Então, o conselho de paz é apresentado como o decreto que domina todos os outros decretos de Deus concernente ao fim último de todas as coisas, como Deus as concebeu em seu conselho.
Ao invés de um decreto concernente aos meios, o conselho de paz é o decreto concernente ao fim de todas as coisas. Ao invés de um lugar subordinado na ordem dos decretos de Deus, o lugar principal deve nesse caso ser dado ao conselho de paz nos decretos eternos de Deus. Portanto, a questão é se a Escritura ensina que a idéia do pacto é um acordo ou uma relação viva de amizade, se o pacto é apresentado como meio ou como o fim, como o caminho ou como a própria essência da religião e salvação.
Em resposta a essa questão, é certamente requerido que procedamos a partir do que a Escritura ensina concernente ao ser e vida do Deus infinito. Por detrás de todo ser e acontecimento, por detrás de todas as relações e conexões das criaturas e delas com o criador, reside o decreto eterno do Altíssimo. Conhecida de Deus são todas as suas obras desde a eternidade (Atos 15:18). Tudo o que existe é e se torna somente de acordo com a sua vontade eterna.
Mas o decreto não é o fundamento último a ser considerado. Por detrás do decreto permanece o próprio Deus infinito, sempre bendito e auto-suficiente. O decreto é o decretar de Deus. Assim como a causa de todas as coisas reside no decreto de Deus, o motivo do decreto também deve ser encontrado na existência e na vida do próprio Deus. O decreto é a sua boa vontade. Ele, o decreto, é perfeitamente soberano. Não é determinado nem motivo por algo fora de Deus. Ele faz todas as coisas por causa do seu nome, até mesmo o ímpio para o dia do mal. Ninguém jamais lhe deu um conselho ou instrução. Nada jamais o limitou ou determinou. Em seu decreto eterno Deus é perfeitamente soberano. As razões e motivos para o seu decreto sempre devem ser encontradas nele mesmo, e essas razões e motivos sempre se concentram ao redor do único propósito de todas as coisas, sua auto-revelação e auto-glorificação.
É sempre requisito nos voltarmos das coisas criadas para o decreto de Deus e do decreto para o que a Escritura ensina concernente ao próprio Deus eterno, pois somente a partir da sua existência pode ser explicada a existência de todas as coisas, não no sentido panteísta, mas de acordo com o conselho de sua vontade. Por conseguinte, a idéia e a essência do pacto também devem ser explicadas a partir da relação entre as três pessoas da santa Trindade.
Fonte: Reformed Dogmatics, Herman Hoeksema, Reformed Free Publishing Association, vol. 1, pp. 453-455.